“Raciocínio motivado” é o nome dado por cientistas sociais ao processo de decidir em quais evidências acreditar baseado na conclusão que se prefere. (...) Essa tendência muito humana se aplica a todos os tipos de fatos sobre o mundo físico, história econômica e eventos recentes.
A negação não tem origem na ignorância: O estudo interdisciplinar desse fenômeno explodiu durante os últimos seis ou sete anos. Uma coisa se tornou clara: o fracasso de vários grupos em reconhecer a verdade sobre, digamos, mudanças climáticas, não é explicada pela falta de informação acerca do consenso científico sobre o assunto. Em vez disso, o que prevê a negação do conhecimento de especialistas sobre muitos assuntos controversos é, simplesmente, a persuasão política.
Podemos entender as duas estratégias adotadas para controlar o coronavírus. A primeira é aquela que, perante a ausência de vacinas e medicamentos, investe maciçamente nos únicos meios de proteção existentes, propondo o isolamento social obrigatório e criando auxílios e redes de proteção para as populações vulneráveis (...). A segunda é a adotada no Brasil: uma estratégia negacionista (...), como se nada devesse mudar com a pandemia. (...) Parecem ignorar a ameaça da epidemia; dirão que cada um deve cuidar de sua própria vida, pois não podemos limitar o direito de ir e vir.
Sandra Caponi, in: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-40142020000200209&script=sci_arttext/.
O negacionismo, ou seja, a escolha de negar os fatos como forma de escapar deles, de acordo com Lília Schwarcz, professora do Departamento de Antropologia da USP (Universidade de São Paulo), costuma se fortalecer quando a sociedade se depara com situações de instabilidade, como uma crise fora do normal ou algo nunca antes presenciado na atualidade, por exemplo. Quando em oposição às evidências científicas, a atitude negacionista encontra sustentação em teorias e discursos conspiratórios, sem aprofundamento ou isolados, e até favorece disputas ideológicas e interesses políticos e religiosos. (...)
Impactos do negacionismo na saúde
Na África do Sul, entre 1999 e 2008, o presidente (...) negou a gravidade do surto da Aids, e hoje o país detém quase 20% dos infectados do planeta —7,7 milhões de pessoas. Na época, a ministra da Saúde (...) também ignorou a doença. (...) Mais recentemente, em paralelo com o movimento antivacina, que contesta, sem nenhum embasamento científico, a eficácia e a segurança da imunização, o índice de cobertura vacinal vem caindo, e doenças contagiosas erradicadas ou perto disso voltaram a aparecer com mais força. No Brasil, por exemplo, o sarampo retornou em 2019. A vacinação contra a poliomielite (paralisia infantil) que, desde 1990 estava controlada por aqui, em 2016 não atingiu sua meta. Algo similar vem ocorrendo com hepatite A, BCG, rotavírus, meningocócica C e pentavalente. No atual momento, enquanto é preciso manter e ampliar o isolamento social para conter o avanço do novo coronavírus (Sars-CoV-2), o negacionismo ignora seu potencial, o estado e a capacidade dos hospitais em lidar com os doentes e a ocorrência de milhares de mortes no Brasil e no mundo.
A Amazônia brasileira tem registrado as maiores taxas de
desmatamento dos últimos cinco anos. No mês passado, o ritmo se manteve, mesmo
com ação de militares desde maio e pressão de investidores estrangeiros para
controle do problema. Segundo o sistema Deter do Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais (Inpe), que realiza levantamento rápido de alertas de
evidências de alteração da cobertura florestal na Amazônia, no mês passado,
houve perda de 1.034,4 km². (...) O fato é que o governo brasileiro terá que
abandonar a sua posição negacionista quanto aos problemas ambientais e os
incentivos à deflorestação (...). A mudança de postura será necessária para
defesa de interesses comerciais concretos e para restabelecer a percepção externa
sobre o Brasil.
A partir da leitura dos textos motivadores seguintes e com base nos conhecimentos construídos ao longo de sua formação, redija texto dissertativo-argumentativo em modalidade escrita formal da língua portuguesa sobre “Os impactos da cultura do negacionismo científico no Brasil do século 21”, apresentando proposta de intervenção, que respeite os direitos humanos. Selecione, organize e relacione, de forma coerente e coesa, argumentos e fatos para defesa de seu ponto de vista.