(Maurício de Souza, Turma da Mônica, 1985)
“A Gramática Tradicional permanece viva e forte porque, ao longo da história, ela deixou de ser apenas uma tentativa de explicação filosófica para os fenômenos da linguagem humana e foi transformada em mais um dos muitos elementos de dominação de uma parcela da sociedade sobre as demais. Assim como, no curso do tempo, tem se falado da Família, da Pátria, da Lei, da Fé etc. como entidades sacrossantas, como valores perenes e imutáveis, também a ‘Língua’ foi elevada a essa categoria abstrata, devendo, portanto, ser ‘preservada’ em sua ‘pureza’, ‘defendida’ dos ataques dos ‘barbarismos’, ‘conservada’ como um ‘patrimônio’ que não pode sofrer ‘ruína’ e ‘corrupção’.”
(BAGNO, Marcos. Preconceito Linguístico. São Paulo: Edições Loyola, 1999.)
Foi notícia uma terapeuta da fala (ou fonoaudióloga, termo usado no Brasil) ter visto a sua candidatura ao exercício da função no Serviço Nacional de Saúde ser rejeitada com base no seu deficiente domínio da língua portuguesa, aparentemente pelo facto de ser brasileira e falante de português do Brasil. O caso de cidadãos brasileiros discriminados por razões linguísticas em Portugal é recorrente e este preconceito tenderá, acredito, a intensificar-se com a chegada de mais cidadãos brasileiros com formação superior. Já me referi à questão em texto anterior, a propósito de dissertações e teses apresentadas por alunos brasileiros a universidades portuguesas e ocorre-me a discriminação de que são alvo colegas brasileiros, com competências e currículos inatacáveis, quando se candidatam a ensinar linguística ou língua portuguesa em instituições públicas de ensino superior.
Sem me ater ao caso concreto (que provavelmente seguirá trâmites adequados), permito-me partilhar duas ideias a este respeito. 1) A variedade brasileira do português é português: existe intercompreensão entre falantes das variedades portuguesa e brasileira; a língua oficial do Brasil é português; as relações entre os dois países e o empenho em ações comuns de difusão da língua portuguesa têm-se intensificado. É absurdo, pois, exigir a falantes brasileiros de língua portuguesa e que obtiveram as suas formações no Brasil que façam prova de que falam português, seja como língua materna ou (pasme-se) como língua estrangeira. 2) Na formação dos terapeutas da fala, existe uma forte componente de descrição linguística do idioma de trabalho, i.e., ao conhecimento implícito da língua junta-se o conhecimento explícito, científico, das características do idioma. Esta formação é imprescindível ao desempenho da atividade, pois é fundamental determinar a natureza exata do problema em análise para a adoção de terapia adequada e eficaz. Um terapeuta de fala, independentemente da variedade que fale, tem conhecimento científico que lhe permite intervir na recuperação de falantes de qualquer variedade linguística estabelecida. Em suma, se um cidadão fala, de facto, português e tem formação adequada, certificada por instituição de ensino superior portuguesa, não compreendo como as suas competências para o exercício da terapia da fala em Portugal possam ser questionadas.
Será que os membros do júri destes concursos sabem o que é variação linguística? [...]
(CORREIA, Margarita. Brasil, Portugal e esta língua que nos (des)une. Lisboa: Diário de Notícias, 28 nov. 2020. Disponível em: https://www.dn.pt/edicao-do-dia/28-nov-2020/brasil-portugal-e-esta-lingua-que-nos-desune-13084931.html.
A partir da leitura dos textos motivadores e com base nos conhecimentos construídos ao longo de sua formação, redija um texto dissertativo argumentativo em modalidade escrita formal da língua portuguesa sobre o tema “As exclusões e os prejuízos perpetuados pelo preconceito linguístico no Brasil” apresentando proposta de intervenção que respeite os direitos humanos. Selecione, organize e relacione, de forma coerente e coesa, argumentos e fatos para defesa de seu ponto de vista.